sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Cultura da Paz: Um Olhar Fotográfico

Tente lembrar-se das últimas notícias que você viu ou ouviu, seja em um jornal impresso ou um programa de TV. Agora, tente lembrar-se das imagens que essas notícias utilizavam para ilustrar esses acontecimentos. Não demora muito tempo para revelar um mundo completamente caótico: bombas explodindo, fome na África, vítimas da mudança climática, genocídio, ataques terroristas, torturas. É praticamente impossível folhear o jornal, em qualquer dia, e não dar de cara com imagens chocantes da condição humana. 

artigo_cultura_paz01.jpgNa atualidade, observa-se inúmeros conflitos armados entre e dentro de países, que têm como resultado o sacrifício de vidas e um legado que imprime à memória traumas que possuem grandes probabilidades de serem repassados para futuras gerações. Além das guerras, existem outras fontes de tensão como a desigualdade econômica e social, a degradação ambiental, intolerância étnica e religiosa que também contribuem com o ciclo de violência que permeia nossos dias como se fosse algo natural.


Na contraproposta dessa situação, a UNESCO declarou que os primeiros dez anos do século XXI seria a “Década Internacional da Cultura da Paz”. O objetivo da declaração baseou-se em propor, em vários países, ações concretas, principalmente educacionais e culturais, que visavam substituir a secular cultura de guerra por uma cultura de paz. Tendo como norte a criação de um novo humanismo, baseado essencialmente nos ideais de solidariedade, bondade, respeito, dignidade, alteridade, a proposta da UNESCO foi sensibilizar o maior número de pessoas para a idéia de que a paz não é somente a ausência de guerra, mas um estado de consciência coletivo cujo fim último é o bem estar humano. No Brasil, várias entidades engajaram no projeto: as ONGs Viva Rio, Afroreggae, CUFA (Central Única das favelas), MEC, Unipaz etc.

Falar em cultura da paz pode parecer algo bastante idealista, filosófico, distante da realidade, uma meta com pouco senso prático, um comportamento quase etéreo. Porém, muitas pessoas acreditam que a cultura de guerra é um legado historicamente passado por nossos ancestrais e, assim, com pensamento crítico e organização social, é possível pensar e modificar essa herança para construir outros valores. 
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É interessante notar que a idéia do projeto da UNESCO não é acabar com as guerras, uma proposta que seria surreal. O que se deseja é refletir sobre a paz e criar atitudes pessoais que levam em consideração a dignidade alheia, como está escrito em uma das frases mais bonitas da constituição da organização: “Se a guerra nasce na cabeça dos homens, é na cabeça dos homens que deve nascer os baluartes da paz”.


Nesse sentido, o projeto “Fotografia para Paz”, que por ora apresentamos, objetiva utilizar a fotografia como expressão artística de olhares diversos sobre o mundo que nos cerca. O exercício é bastante simples, mas exige um olhar afinado: reconhecer realidades de paz desde o cotidiano, o que implica registrar momentos de solidariedade, gentileza, bondade, companheirismo, diversidade, respeito, altruísmo, amor, alegria, idéias sociais.
A fonte de inspiração desse projeto vem das  fotografias de Palê Zuppani (WWW.fotonatural.com.br) que convergem em momento único a simplicidade com a beleza da vida e do  criativo trabalho realizado pelo pesquisador Fabrício Carrijo (http://www.flickr.com/photos/fabriciocarrijo/), que também ministrará o projeto conosco. Como pesquisador da Cátedra UNESCO de Filosofia para a Paz, Universidade Jaume I, Castellón, Espanha, Fabrício desenvolveu um estudo sobre a relaçao entre fotografia, identidade e paz. Com o intuito de fotografar realidades de paz, ele esteve inserido em uma variedade de contextos culturais por mais de 15 países.artigo_cultura_paz03.jpg

A proposta de utilizar a fotografia como arte para sensibilizar e encorajar a transformação social nada contra a correnteza das imagens diárias que nos assaltam logo no café da manhã e que inspiram a cultura da violência. Fotografia para a Paz, constitui um intento, entre outros, com expectativa no potencial da arte como elemento de reflexão e transformação; um gesto em demonstração de que é possível transcender a violência e edificar ambientes de paz; um projeto em construção cujo âmago leva a esperança de que esta prática possa gerar ecos, que gerem outros, e desde a aparente trivialidade do cotidiano, possamos ir tecendo realidades de paz.

É importante dizer que não estamos descartando a importância das fotografias que de tão fortes mais parecem um tapa na cara e que denunciam a desumanidade perpetrada pelo homem contra o próprio homem. Quando não regadas pelo sensacionalismo, elas muitas vezes exercem no coletivo uma postura de indignação (ou indiferença para alguns!) de que esses atos jamais deveriam ocorrer. Inúmeras são as imagens que rodaram o mundo e exerceram grande impacto na sociedade internacional e na política mundial. 

artigo_cultura_paz04.jpgQuem não se lembra da foto da menina nua correndo pelas ruas do Vietnã após seu vilarejo ter sido atingido por uma bomba?  Huynh Cong Ut, fotógrafo da Associated Press, ganhou o Prêmio Pulitzer do ano seguinte ao registro e sua imagem transformou-se no símbolo dos ativistas contrários ao conflito. Ou da imagem enquadrada, em 1993, pelo fotógrafo sul-africano, Kevin Carter, que capturou o último fio de vida de uma criança somali falecendo de inanição e logo a sua espreita um gigante arbutre aguardando pelo ataque? Kevin também ganhou o pulitzer de melhor fotografia, porém, três dias após o anunciado, já sofrendo de depressão a longa data, o fotógrafo deixou a vida por opção.  Em 2010, o World Press Photo (worldpressphoto.org), considerado o oscar da fotografia internacional,  premiou o fotojornalista Adam Fergunson do New York Times  que capturou o preciso momento em que uma mulher fora retirada de um cenário caótico, onde um homem bomba acabara de se explodir em Kabul, capital do Afeganistão. 

De tal forma, imagens de violência, dor e sofrimento parecem ser a forma mais habitual de retratar o mundo em que vivemos. Assim, o que se pretende com o projeto ”Fotografia para a Paz” é utilizar a fotografia como contra-discurso dessa corrente. O desafio é atingir mudanças criativas na forma de se comunicar e compartilhar com outras lentes as situações mais diversas que ocorrem na fugacidade cotidiana.

artigo_cultura_paz05.jpgPara participar do projeto não é preciso saber técnicas de fotografia, tampouco ter uma câmera específica, pode-se utilizar até mesmo câmeras de celulares. A única coisa necessária é disposição para sair e ver o mundo com outros olhos e ter a perspicácia de registrar esse momento decisivo para depois compartilhar com o grupo a sua experiência.

O projeto de extensão tem duração de 4 meses e os encontros ocorrerão toda segunda-feira, a partir das 19h, no NAPRI (Núcleo Amazônico de Pesquisa em Relações Internacionais). No primeiro mês, os encontros serão baseados em leituras e discussões sobre os seguintes temas: Relações Internacionais e paz; identidade/alteridade e paz; técnicas básicas de fotografia e estudo de fotos; fotografia para paz.  O segundo mês é livre.  O participante sairá em busca da sua imagem, a que mais ele acredita ser sua fotografia que exprime a idéia de paz. E o terceiro e quarto meses são específicos para compartilhar e discutir com o grupo quais imagens serão selecionadas para a exposição que será realizada no Espaço Cultural Orla Taumanan e possivelmente em outros locais da cidade.  Durante o projeto será montado um blog que disponibilizará todo o andamento das atividades.  Se tudo ocorrer como planejamos, a exposição terá início a partir do dia 09 de junho. 

artigo_cultura_paz06.jpgO projeto é gratuito, aberto para toda comunidade, com certificado de participação e o único custo dos interessados será a revelação da foto escolhida para a exposição.  As inscrições serão feitas entre os dias 14 e 26 de março no Instituto Insikiran, entre às 9h e 12h. O projeto inicia no dia 28 de março.